O aumento dos casos de Covid-19 e a chamada “nova onda” de contaminação, vem despertando mais uma vez a atenção do público leigo para os termos médicos relacionados ao tratamento da Covid.

Questionamentos relacionados ao tratamento precoce, ao calendário de vacinação no país e também ao uso de ventilação mecânica em pacientes internados são os temas mais pesquisados. Na última sexta-feira, dia 19, a BBC de Londres publicou uma matéria com a seguinte manchete: “80% dos intubados por covid-19 morreram no Brasil em 2020”[1]. Os dados foram publicados na revista médica The Lancet Respiratory Medicine, e os números apresentados foram coletados no período de 16 de fevereiro a 15 de agosto de 2020 com base em 254 mil internações. Esse número assustou muita gente, principalmente pelo fato de a média mundial de óbitos estar 30% abaixo dos índices brasileiros. Entretanto, um levantamento chinês indica números ainda mais alarmantes na província de Wuhan, onde teria surgido a doença. Lá, a taxa de mortalidade dos pacientes intubados atingiu 97%[2]. A justificativa para números tão altos poderia estar no fato de que os pacientes quando necessitam ser intubados já apresentam a doença em progressão desfavorável.

Porém na reportagem, a BBC evidencia a falta de protocolos unificados no Brasil, além de experiência adequada dos profissionais na linha de frente. A ventilação pulmonar mecânica é um procedimento agressivo e que apresenta certos riscos para pacientes intubados. Mas antes de falar das consequências da intubação, vamos conhecer um pouco mais sobre procedimento.

Por que os pacientes com Covid são intubados?

O coronavírus provoca uma série de sintomas diversos, e com a evolução de novas cepas, a sociedade científica ainda busca respostas para o comportamento da nova doença. Entretanto, a principal característica que tem levado os pacientes a óbito é o fato de apresentarem um comprometimento dos pulmões – o que reduz a sua capacidade respiratória.

A intubação orotraqueal e ventilação mecânica é basicamente uma forma invasiva de oferecer aos pulmões debilitados um ar rico em oxigênio, para manter seus níveis adequados no sangue. O procedimento leva este gás diretamente aos pulmões, sem que o paciente precise fazer esforço respiratório, comum nos pacientes acometidos pelo coronavírus. O ventilador mecânico, ou VM, é indicado em casos de insuficiência respiratória aguda – em casos que apresentam uma queda na taxa de oxigênio no sangue (hipoxemia) ou quando há um ritmo irregular na respiração (taquipneia) que pode levar a fadiga. Além desses fatores, pacientes que apresentam sonolência excessiva ou rebaixamento de nível de consciência também podem ser elegíveis, pois este quadro pode estar relacionado a uma incapacidade respiratória e de manutenção da via aérea pérvia.

Como é o procedimento de intubação?

O procedimento de intubação de um paciente deve ser realizado apenas por profissionais capacitados. Médicos anestesistas têm sido especialmente requisitados para a tarefa, devido a sua experiência no chamado “manejo de via aérea”, ventilação mecânica e sedação. Uma cânula é introduzida na boca do paciente até ser posicionado na traquéia. Por este motivo, a pessoa deve ficar sedada e com medicações analgésicas durante o tratamento. A alimentação acontece por meio de uma sonda que é inserida pelo nariz até o estômago, ou ainda por via venosa. O paciente é hidratado diariamente com soro injetado diretamente nas veias. Os pacientes intubados precisam de cuidados intensivos de equipe multiprofissional e monitorização contínua. Os ventiladores mecânicos possuem alguns parâmetros reguláveis que precisam ser assistidos e monitorizados frequentemente. De acordo com a evolução do quadro e exames diários (gasometria arterial), é possível regular a pressão do aparelho, o fluxo e a porcentagem de oxigênio expelida por estas máquinas.

O aparelho conta com um monitor que registra os dados do paciente e produz curvas de desempenho que auxiliam os médicos e fisioterapeutas a avaliar a progressão dos casos.

E os riscos?

Como já mencionamos antes, a ventilação mecânica invasiva só é recomendada quando o quadro do paciente não evolui de forma satisfatória com métodos não invasivos. Isso ocorre porque a intubação e ventilação mecânica podem ser nocivas ao paciente que já está debilitado, tendo risco de desenvolvimento de infecções e lesão pulmonar associada aos volumes de oxigênio inseridos. Esse processo acarreta automaticamente num enfraquecimento do diafragma (músculo que auxilia na expansão pulmonar) e, com isso, o retorno a uma respiração espontânea posteriormente fica prejudicado.

Há também o risco de entrada de ar entre o pulmão e a parede torácica, intercorrência denominada pneumotórax, que interfere nas trocas gasosas, além de ser causa de instabilidade hemodinâmica e parada cardiorrespiratória.

Quanto tempo uma pessoa pode ficar intubada?

Não há uma contagem exata do tempo que o paciente pode ficar intubado. O processo de extubação (retirada dos tubos) é definido pela equipe após uma avaliação criteriosa do quadro geral do paciente. É levada em consideração, primeiramente, se a causa da intubação já está tratada ou em recuperação progressiva. Pacientes com Covid precisam apresentar uma regressão satisfatória do quadro respiratório. Isso ocorre muitas vezes quando o paciente volta a respirar sozinho, com pouca ou nenhuma ajuda da VM e consegue manter os níveis adequados de oxigênio na circulação.

Diante de tal cenário, como se manter otimista?

É importante termos a consciência da delicadeza do momento e da necessidade primordial de tomar todos os cuidados necessários para evitar o contágio. As melhores formas de se prevenir ainda são as mais simples: evitar aglomerações, deslocar-se somente quando for absolutamente necessário, evitar contato físico com outras pessoas – abraços, cumprimentos de mão, mesmo com máscara devem ser evitados. Lavar bem as mãos e não utilizar a roupa com a qual você saiu na rua dentro de casa (o mesmo vale para os sapatos). Higienize sempre objetos e principalmente as mãos com álcool em gel. Embora circulem notícias de todos os tipos nas redes sociais, não há nenhuma confirmação de medicamento que funcione de maneira preventiva ou precoce. As chamadas ‘novas ondas’ trazem vírus ainda mais resistentes e agressivos que causam uma tempestade inflamatória. Portanto, mesmo que a pessoa já tenha recebido a primeira dose da vacina, todo cuidado é pouco. Cuide de você, cuide dos seus e, principalmente, cuide da sua saúde mental. Estudos comprovam que pessoas fragilizadas emocionalmente tem maior propensão a desenvolver doenças. Por isso eleja bem suas fontes de informação e evite ficar acessando notícias ruins o tempo inteiro.

Apesar das estatísticas desanimadoras, a intubação – quando necessária – é uma espécie de chance extra que o organismo ganha para se restabelecer. É preciso confiar na experiência das equipes multiprofissionais que lutam incessantemente para combater o coronavírus e suas complicações.

Leita também: Avaliação pré-anestésica (APA)

[1] 80% dos intubados por covid-19 morreram no Brasil em 2020. https://www.bbc.com/portuguese/brasil-56407803?at_medium=custom7&at_campaign=64&at_custom4=F56952B6-88A4-11EB-B01D-D0373A982C1E&at_custom3=BBC+Brasil&at_custom2=facebook_page&at_custom1=%5Bpost+type%5D&fbclid=IwAR02myk_BNhRK4y9KhkCLP1J1YrKtdJPi5i9rjC0qKR73jHu_GwYpllPS_I

[2] Zhou F Yu T Du R et al. Clinical course and risk factors for mortality of adult inpatients with COVID-19 in Wuhan, China: a retrospective cohort study. Lancet. 2020; (publicado online em 9 de março.) https://doi.org/10.1016/S0140-6736(20)30566-3